sexta-feira, 29 de abril de 2011

Os comunistas


Os comunistas
Pablo Neruda
Passaram-se alguns anos desde que ingressei no Partido
Estou contente
Os comunistas formam uma boa família
Têm a pele curtida e o coração moderado
Por toda parte recebem golpes
Golpes exclusivos para eles
Vivam os espíritas, os monarquistas, os anormais, os criminosos de todas as espécies
Viva a filosofia com muita fumaça e pouco fogo
Viva o cão que ladra mais não morde, vivam os astrólogos libidinosos, viva a pornografia, viva o cinismo, viva o camarão, viva todo mundo, menos os comunistas
Vivam os cintos de castidade, viam os conservadores que não lavam o pé a quinhentos anos
Vivam os piolhos das populações de miseráveis, viva a fossa comum e gratuita, viva o anarcocapitalismo,
viva Rilke, viva André Guide com seu corydonzinho, viva qualquer misticismo
Esta tudo bem
Todos são heróicos
Todos os jornais devem sair
Todos devem ser publicados, menos os comunistas
Todos os candidatos devem entrar em São Domingos sem algemas
Todos devem celebrar a morte do sanguinário de Trujillo, menos os que mais duramente o
combateram
Viva o Carnaval, os últimos dias de carnaval
Há disfarces para todos
Disfarces de idealistas cristãos, disfarces de extrema esquerda, disfarces de damas beneficentes e
de matronas caritativas
Mas cuidado: Não deixem entrar os comunistas
Fechem bem a porta
Não se enganem
Eles não têm direito a nada
Preocupemos-nos com o subjetivo, com a essência do homem, com a essência da essência
Assim estaremos todos contentes
Temos liberdade
Que grande coisa é a liberdade!
Eles não a respeitam,
Não a conhecem
A liberdade para se preocupar com a essência
Com a essência da essência
Assim tem passados os últimos anos
Passou o Jazz,
Chegou o Soul, naufragamos nos postulados da pintura abstrata, a guerra nos abalou e nos matou
Tudo ficava como está
Ou não ficava?
Depois de tantos discursos sobre o espírito e de tantas pauladas na cabeça, alguma coisa ia mal
Muito mal
Os cálculos tinham falhado
Os povos se organizavam
Continuavam as guerrilhas e as greves
Cuba e Chile se tornavam independentes
Muitos homens e mulheres cantavam a Internacional
Que estranho
Que desanimador
Agora cantam-na em chinês, em búlgaro, em espanhol da América
É preciso tomar medidas urgentes
É preciso bani-lo
É preciso falar mais do espírito
Exaltar mais o mundo livre
É preciso dar mais pauladas e o medo de Germán Arciniegas
E agora Cuba
Em nosso próprio hemisfério, na metade de nossa maça, esses barbudos com a mesma canção
E para que nos serve Cristo?
Para que servem os padres?
Já não se pode confiar em ninguém
Nem mesmo os padres. Não vêem nosso ponto de vista
Não vêem como baixam nossas ações na bolsa
Enquanto isso sobem os homens pelo sistema solar
Deixam pegadas de sapatos na lua
Tudo luta por mudanças, menos os velhos sistemas
A vida dos velhos sistemas nasceu de imensas teias de aranhas medievais
No entanto, há gente que acredita numa mudança, que tem posto em prática a mudança, que tem
feito triunfar a mudança, que tem feito florescer a mudança
Caramba!
A primavera é inexorável!

Sex Pistols - "God save the Queen" e The Clash London Calling

No dia do casamento real, os punks sempre tem as melhores palavras para falar sobre isso



quarta-feira, 27 de abril de 2011

Pão, circo e o sonho do príncipe encantado


Marx começa uma de suas obras primas “O 18 Brumário de Luis Bonaparte” citando Hegel e ironizando ainda por cima:
“Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa. Caussidière por Danton, Louis Blanc por Robespierre, a Montanha de 1845-1851 pela Montanha de 1793-1795, o sobrinho pelo tio. E a mesma caricatura ocorre nas circunstâncias que acompanham a segunda edição do Dezoito Brumário!”[1]
Obviamente não se trata de uma lei universal, mas sim de uma constatação possível de ser feita de fatos históricos, que ocorrem de formas semelhantes, pois as contradições encontradas na realidade não foram superadas em ambas as épocas.
Pois bem, esmiuçando isso podemos voltar ao objetivo do texto que é falar sobre o casamento do Príncipe William que ocorrerá no próximo dia 29 de abril, e ao falar de seu casamento não dá para não compara-lo com o de sua mãe ocorrido há 29 anos.
Afinal a Inglaterra de 2011 lembra muito a de 1981, um país em crise econômica, com a economia estagnada, uma coalizão governamental entre conservadores e liberais (no caso de 1981 era só os conservadores liderados por Margareth Tatcher) que ainda não disse ao que veio, enfim condições propícias a baixar a moral de qualquer povo do mundo.
A solução para espantar revoltas e reforçar o orgulho nacional é somente uma, reforçar os valores que ainda tornam os britânicos melhores, ou então um povo único no planeta, que é reviver um passado longínquo trazendo a ideia da monarquia e do finado Império Britânico.
Para isso a população é entorpecida com os rituais de casamento, e a esperança de que esse símbolo da ideia do que é ser britânico continue a perdurar, mesmo que os poderes de chefe de Estado dos monarcas ingleses sejam irrelevantes no contexto atual.
Assim a farsa que repete a tragédia não é o ato do casamento em si, mas o que ele representa a utilização do nacionalismo para entorpecer a população, legitimar um governo não tão popular (afinal foi preciso uma coalizão de forças partidárias para atingir a maioria e conseguir governar) evitando que a onda de protestos do mundo árabe que chegou até ao coração dos EUA chegue também ao outro centro do capitalismo financeiro mundial.
Mesmo que a monarquia britânica possua um papel meramente figurativo no dia a dia do país, diante da necessidade se torna uma arma política poderosa, arma essa que atravessa as fronteira da ilha e alastra-se por todo mundo na simbologia da plebeia que se torna princesa e pode vir a ser rainha algum dia, movimentando todo o sonho de inúmeras mulheres pobres, sem escolaridade de que um dia também podem vencer na vida caso encontre um príncipe encantado, reforçando a diminuição da mulher frente aos homens mesmo que a nova princesa seja vendida como uma mulher fina, inteligente e engajada, os estereótipos reais passam por cima disso e podem acabar até com a vida da pessoa caso ela fuja do seu papel pré-estabelecido (vide o triste fim da princesa Diana).
A monarquia britânica sobreviveu às revoluções burguesas e a inúmeras crises econômicas, e tudo leva a crer que sobreviverá à mais coisas, pois continua a ter sucesso nos momentos em que é necessária a manutenção da ordem social, nesse cenário cabe ao povo britânico não aceitar essa política de pão e circo e combater essas estruturas arcaicas de poder.
João Vicente Nascimento Lins 27/04/2011


[1]Esse trecho foi retirado da edição online no texto presente no seguinte endereço : O 18 Brumário de LuisBonaparte

segunda-feira, 11 de abril de 2011

O que Marx pode dizer sobre as revoltas árabes


A impressão que se tem ao observar o rumo que as revoltas árabes seguem no dia-a-dia é de que estamos vendo as estupendas analises de Karl Marx em o 18 Brumário e em A Guerra Civil na França ganhar vida na nossa frente.
Na primeira obra Marx analisa de forma profunda todos os movimentos da burguesia francesa entre 1848 e 1852, ou seja, o período do governo de Luis Bonaparte, e como a burguesia ao ver a possibilidade de a classe trabalhadora aumentar seu poder e radicalizar a revolução prefere apelar para uma figura autoritária abrindo a mão de qualquer liberalismo para se aliar a aristocracia e consolidar seu poder assumido na revolução francesa.
O outro setor da burguesia, a pequena burguesia, que contava com o apoio da guarda nacional e da classe trabalhadora e que possuía um programa semelhante ao da social democracia dos dias atuais foi derrotada pelos outros setores, pois o medo de radicalização do processo levou à ser covarde a preferir acabar com toda a ordem social.
Já os acontecimentos narrados no segundo são consequências diretas do primeiro, a guerra de unificação alemã contribuiu para a queda de Luis Napoleão, a crise econômica e a derrota para a Alemanha levou a população de Paris a se revoltar, dando início a histórica Comuna de Paris em 1871.
A Comuna foi um governo inteiramente popular, os trabalhadores de Paris se organizaram por meio de assembleias com voto direto, as mulheres eram linha de frente na defesa da cidade, foi uma tentativa de governo popular, que uma vez com o poder em mãos cometeu o erro de não levar até as últimas consequências sua insurreição, não confiscando o capital da burguesia parisiense que havia fugido para comprar armamentos para continuar a defesa.
O fato de ambas as obras falarem sobre a realidade francesa do século XIX não impede de que elas também consigam explicar a realidade do Oriente Médio, afinal ainda vivemos no mesmo modo de produção, as contradições existentes não foram superadas, muito pelo contrário, estão cada vez expostas, a burguesia solidificou o seu papel de contra revolucionária e desde então tem usado todo o aparato do Estado para reprimir a classe operária.
Os Estados do Oriente Médio surgiram no século XX, em sua maioria frutos do fim da colonização das potencias europeias. São países, portanto de desenvolvimento hipertardio, sua burguesia nesses casos ao invés de desenvolver a indústria do país preferiu abrir o mercado do país para multinacionais, controlando apenas uma ou outra commodity estratégica do país, e mantendo o lucro da venda desse recurso para uma pequena classe ligada diretamente ao governo.
Alguns países da região são controlados governados por monarquias ou líderes autoritários que utilizam da força para manter-se no poder enquanto absolve o lucro das vendas de recursos estratégicos.
A crise econômica de 2008 que atingiu com força esses países devido à sua frágil economia baseados em exportação de produtos primários se tornou um elemento importante para levar a população às ruas e praças. Combinando amplos setores da população como jovens desempregados, trabalhadores, pequena burguesia e organizações religiosas os protestos foram vitoriosos na Tunísia e no Egito. Em pouco tempo o mundo árabe todo parecia prestes a viver os ventos da liberdade.
Ocorre que essas revoltas ameaçaram chegar ao reino da Arábia Saudita o maior produtor de petróleo do planeta, o que poderia comprometer o abastecimento e o lucro das empresas estadunidenses, a monarquia saudita possui ligações muito estreitas com o governo dos EUA, e provavelmente  ambos os governos devem ter pensado que caso as revoltas continuem seus interesses podem ser muito prejudicados.
Aproveitando-se da confusa situação da Líbia, onde a população procura tomar o poder, mas seu autoritário líder se recusa a capitular, montaram uma operação de contra revolução para tentar controlar o rumo dos protestos, dando uma falsa sensação de democracia ao mesmo tempo em que tenta colocar novos aliados na liderança dos protestos.
 
Recorrendo às duas obras citadas no inicio do texto, quando a classe operária sonha em se organizar e até demonstra algum tipo de ameaça, a burguesia sempre irá mostrar sua face mais autoritária, direitos humanos e liberdade de expressão são pura retórica, como se viu em todos os países árabes a vontade dos governantes e da alta burguesia é a de manter a ordem vigente, afinal mantém seus bolsos cheios.
Ao mesmo tempo a massa que foi às ruas nas principais cidades da região era um emaranhado de vários grupos, sem uma identidade única que não fosse a busca por liberdade. Ocorre que no capitalismo lutar para transformar uma contradição em outra não resolve os problemas apenas os piora, o grande erro da Comuna de Paris foi não levar seu modelo de governo popular até as ultimas consequências, atacando e acabando com as desigualdades e com a propriedade privada.
O erro das massas árabes é semelhante, não levar às ultimas consequências, achar que só a liberdade irá solucionar seus problemas econômicos, na primeira oportunidade que tiver a pequena burguesia não irá pensar duas vezes, vai se aliar ao governo e esquecer-se de sua busca por liberdade. Os grupos religiosos pensam de forma semelhante, só irão lutar até o ponto em que seus desejos de manutenção da ordem também não forem atacados.
Obviamente as revoltas ocorrem num contexto onde o padrão é a população afastar-se cada vez mais da ação política e de ideologias, principalmente no caso da população do norte da África e Oriente Médio, reféns de ditaduras sanguinárias.
Marx era um gênio que conseguiu desvendar os problemas da sociedade da sua época como poucos fizeram durante toda a história humana, se os problemas persistem os mesmo do século XIX é por que não foram solucionados e cabe a todos nós lutarmos com todas as forças para impedir que as forças da contra revolução conquistem a vitória mais uma vez como em 1848, 1871, 1917 e agora em 2011.
João Vicente Nascimento Lins 11/04/2011

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Entrevista a David Harvey, por Atilio Boron


Entrevista a David Harvey, por Atilio Boron from Ion Audiovisual on Vimeo.
En esta entrevista, el geógrafo y profesor de la City University of New York analiza el devenir de la crisis económica internacional. Harvey centra sus observaciones en el carácter cambiante de la crisis y da cuenta de los diversos modos en que esta crisis ha sido afrontada en Estados Unidos, Europa y China.
Agradecimento ao camarada Rodrigo que indicou o vídeo no facebook.